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domingo, 10 de maio de 2009

O futuro da mídia: blogs ou impresso?

Olá Pessoas da Comunicação!

 

Acompanharemos, à partir deste post, a troca de emails entre Steven Johnson, autor de “The Invention of the Air” (A Invenção do Ar)  e “Cultura da Interface”, coordenador do site “Outside.in” e cofundador da “Feed Magazine”. E  Paul Starr – professor de Sociologia na Universidade Princeton (EUA), ganhador do Prêmio Pulitzer de não-ficção em 1984 por “The Social Transformatin of American Medicine” (A Transformação Social da Medicina Americana), e fundador e co-editor da revista “American Prospect”, de onde saiu o debate que postaremos aqui.


Ambos debatem, a mídia (impressa e web) como espaço de fomentação da cidadania e seu futuro.

 

6 de abril de 2009

Prezado Paul,

Comecemos pelos pontos sobre os quais provavelmente vamos concordar. Em primeiro lugar, os jornais historicamente forneceram e fornecem bens cívicos e públicos essenciais para uma cultura democrática saudável.
Em segundo, os jornais se encontram em situação financeira difícil, em razão de transformações de longo prazo operadas em grande medida pela internet, também em razão da crise econômica –que esperamos ser de curto prazo– e, no caso de alguns jornais, por decisões financeiras insensatas de seus proprietários.

Sejam quais forem as causas subjacentes, porém, acho que você e eu concordamos que, dentro de cinco ou dez anos, o setor dos jornais –e, portanto, seu produto editorial– terá aparência fundamentalmente diferente da atual.

A dúvida é se vai ou não emergir um novo modelo que forneça os bens públicos antes garantidos pelos jornais por meio de seus monopólios locais que geravam alta margem de lucro (pelo menos nos EUA).

Acho que existem boas razões para pensar que o sistema de notícias que está se desenvolvendo on-line será melhor que o modelo dos jornais com o qual convivemos nos últimos cem anos.

Uma maneira de enxergar essa transformação é pensar na mídia como um ecossistema.

Na maneira como ela circula a informação, a mídia de hoje é, de fato, muito mais próxima de um ecossistema do que era o velho modelo industrial e centralizado da mídia de massas.

O novo mundo é mais diversificado e interligado –é um sistema no qual as informações fluem com mais liberdade. Essa complexidade o torna interessante, mas dificulta as previsões de como será sua aparência dentro de cinco ou dez anos.

Em lugar de começar pelo futuro, proponho que olhemos para o passado. Quando os ecologistas pesquisam os ecossistemas naturais, procuram as florestas mais antigas, onde a natureza teve mais tempo para evoluir. Para estudar as florestas tropicais, eles não analisam um campo desmatado dois anos antes.

Por analogia, devemos examinar as partes do noticiário on-line que passaram por uma evolução mais longa.

Uma dessas áreas é a reportagem sobre a própria tecnologia. Esta vem crescendo e se diversificando há décadas, fazendo dela uma floresta antiga de notícias on-line.

Por qualquer medida, esse campo hoje é imensamente mais informativo do que era quando comecei a acompanhar questões ligadas à tecnologia, no final dos anos 1980, ainda estudante universitário.

A web não possui uma aptidão intrínseca para cobrir a tecnologia –ela apenas tende a cobrir a tecnologia em primeiro lugar porque as primeiras pessoas que usaram a web eram mais interessadas nessa área.

Mas isso mudou e está continuando a mudar. A transformação do deserto do noticiário de tecnologia dos anos 1980 na rica diversidade da cobertura feita hoje está acontecendo em todas as áreas do noticiário.

Ela está aqui, mas, como no ditado de William Gibson em relação ao futuro, ainda não está distribuída de maneira igual.

Tomemos a política como outro exemplo. A primeira eleição presidencial que eu acompanhei de maneira obsessiva foi em 1992. Todo os dias o “New York Times” publicava um punhado de matérias sobre escalas nas campanhas, debates ou pesquisas de opinião.

Todas as noites eu assistia a programas da televisão a cabo como “Crossfire” para ouvir o que os palpiteiros tinham a dizer sobre os acontecimentos do dia. Eu lia “Newsweek”, “Time” e “The New Republic” e vasculhava a “New Yorker” em busca de seus ocasionais artigos políticos. Quando os debates presidenciais eram transmitidos, eu assistia religiosamente, ficando acordado até tarde para ouvir os comentários dos especialistas reunidos.

É verdade que tudo isso estava longe de constituir um deserto de noticiário. Mas compare-se o que havia então com as informações disponíveis na eleição de 2008.

Tudo que existia em 1992 ainda estava presente, mas fazia parte de uma nova e vasta floresta de notícias, dados, opiniões, sátira –e, o que possivelmente seja mais importante, experiências diretas.

Sites como Talking Points Memo e Politico faziam reportagem direta. Blogs como o Daily Kos traziam relatos aprofundados sobre corridas individuais, algo que o “New York Times” jamais teria tinta suficiente para cobrir.

Blogueiros como Andrew Sullivan reagiam a cada nova virada no ciclo noticiário, e novos analistas como Nate Silver, no Fivethirtyeight.com, faziam análises de pesquisas que superavam de longe qualquer coisa oferecida pela CNN.

Quando a economia implodiu, procurei os blogueiros econômicos, como Brad de Long, e assisti aos debates com mil amigos virtuais tweetando a meu lado no sofá. Tudo isso era remixado por meio das sátiras de Jon Stewart e Stephen Colbert, visto em clipes virais na internet tanto quanto na televisão.

Podemos ver a mesma paisagem em mutação no Reino Unido, onde o blogueiro Guido Fawkes, que não é repórter de jornal, vazou os e-mails que levaram à renúncia do assessor de imprensa de Gordon Brown.

E há mais: o ecossistema de noticiário político incluía informações dos próprios candidatos. Pense no discurso de Barack Obama sobre a questão racial, possivelmente um dos acontecimentos-chave da campanha. Oito milhões de pessoas o acompanharam no YouTube.

Teriam as redes de TV transmitido esse discurso na íntegra em 1992? Com certeza não. Ele teria sido reduzido a um minuto no noticiário noturno. A CNN talvez o tivesse transmitido ao vivo, para 500 mil pessoas. A Fox News e a MSNBC nem sequer existiam.

Para mim, não há dúvida alguma que o ecossistema do noticiário político em 2008 foi muito, muito superior ao de 1992. Alguns podem apresentar o argumento da “câmara de ecos”, dizendo que as fontes que cito têm viés político.

Mas mesmo isso soa suspeito. Afinal, em 1992 eu lia apenas o “New York Times” e o “Nation”. Já em 2008, passei horas lendo a conservadora “National Review” on-line. Ainda era uma “pesquisa junto à oposição”, mas o fato é que essas visões de direita estavam a apenas um clique de distância.

Algumas pessoas argumentam que essa nova diversidade é parasítica: os blogueiros são interessantes, é claro, mas, se as organizações noticiosas tradicionais perdessem peso, os blogueiros não teriam mais sobre o que escrever.

Isso talvez fosse verdade no início desta década, mas não é mais. Imagine quantos barris de tinta foram comprados para imprimir comentários em jornais sobre a gafe de Obama em relação a “pessoas que se apegam a suas armas e à religião”.

Mas essa frase não foi reportada originalmente pelo “New York Times” ou o “Wall Street Journal”, e sim pelo Huffington Post. É possível, é claro, que grandes jornais nacionais, como o “Times”, possam acabar florescendo nesse novo ambiente. Mas a sala de briefing da Casa Branca vai ficar mais e mais cheia. Não é que os jornais irão desaparecer –é apenas que deixarão de ser a espécie dominante.

A cobertura política da campanha de 2008 foi fértil pelas mesmas razões por que a cobertura das notícias na web é fértil: porque a web já é uma mídia de crescimento antigo.

As primeiras ondas de blogs eram focadas na tecnologia; mais tarde, se voltaram à política. A cobertura política em estilo “web 2.0″ já teve uma década para amadurecer e chegar a seu estado atual.

Agora a mesma coisa está acontecendo com a cobertura de esportes, economia, cinema, livros, restaurantes e notícias locais –todas os temas padrões do velho formato dos jornais estão proliferando on-line. Há mais perspectivas e mais profundidade.

E isso é apenas o crescimento mais recente. As notícias on-line estão apenas começando a amadurecer.

Cordialmente,

Steven

Tradução: Clara Allain, da Folha de S. Paulo.


Resposta do email em breve no Blog CS.


Postado por: Mila Ramos http://porumnovojornalismo.wordpress.com

 

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